sábado, 15 de setembro de 2012

GRITANDO PALHAÇO


A chegada de um circo na cidade, era sempre motivo de muita alegria. Montado em frente a nossa casa, no largo entre os fundos da igreja e o pavilhão, para grande alegria de meu pai, que mais parecia um menino, acompanhando toda a montagem, que durava no máximo 2 dias, pois eram circos mambeme, muito pobres e pequenos. Alguns chegavam a dar dó, lonas de tecido fino, e cheia de remendos.
Nossa casa invariávelmente, virava apoio da trupe, que se abastecia de água e algumas vêzes usavam as nossas instalações, o apoio era real e irrestrito. No espetáculo da noite sempre nos citavam e faziam brincadeiras conosco.
Geralmente, tinham uma área para cadeiras, que deviam ser levadas de casa e o chamado puleiro (arquibancadas), com pouca segurança, feita de tábuas velhas e estreitas.
O espetaculo era distribuido em duas partes, sendo uma de variedades e outra de teatro, com encenação de peças curtas e geralmente, muito penosa, fazendos as mulheres chorar.
Normalmente os palhaço eram muito engraçados, com suas tiradas, piadas  e paródias musicais
de duplo sentido.

                       Ô nêga, oi remeche as cadeiras
                       ô nêga, oi prá lá oi prá cá

                       conheço um rapaz velho,
                       que anda doido, pra se casar
                       e ontem, teve a sorte
                       de uma boa moça, arranjar

                      porém tenho certeza,
                      que êle casa hoje, e morre amanhã!
   
                      POR QUE?  (perguntava a partner)

                      Porque velho, não aguenta,
                      o param, pampam, pampam, pampam!

O palhaço sempre dividia o palco, com uma bailarina gorda, que tinha um sinal artificial,feito com lapis de sobrancelhas, na coxa e outro acima do lábio superior.
Cidade muito pobre, eram poucos que podiam pagar ingresso, portanto era necessário que o espetaculo, principalmente o drama, fosse mudado diariamente, como motivação, para voltar.
O meio de divulgação, era o palhaço, que saia no meio da rua, com as pernas de paus a anunciar, através de um megafone a atração da noite. Os meninos da cidade, que não podiam pagar, se aglomeravam diante do circo, esperando a hora que o palhaço ia sair para "gritar o palhaço", ou seja: fazer a animação.
Como tinha um numero definido, os escolhidos, tinham o braço carimbado, e a noite apresentava na portaria para ter entrada franca.

      - Hoje tem espetáculo?
M  - tem, sim senhor
     - as 7 horas da noite?
M  - tem, sim senhor
     - hoje tem palhaçada?
M - tem, sim senhor
     - e o palhaço o que é?
M  - é ladrão de mulher
     - e aremeche o chenhenhem
M  - chenhenhem, chenhenhem (colocava-se as mãos no joelho, e balançava o bumbum, exatamente  como o grupo È O TCHAN, viria a fazer, muitos anos depois).

O grande suplício dos palhaços, era andar de pernas de pau na cidade que é de relevo irregular, e o solo era de pequenos seixos.
Certa feita, gritei o palhaço, mas a festa durou pouco, quando papai me viu, mandou-me para casa lavar o braço, e disse: nós podemos pagar a entrada, você tirou o lugar de uma criança que não pode.
Quando circo partia, nós todos virávamos artistas circense, com sacos de estopa, que existia na usina, montava uma empanada, debaixo de um pé de árvore, trapézio etc. minhas irmãs, Gagaça, Fátima, Cristina e Vânia, eram as bailarinas, e atrizes da peças e os meninos faziam o palhaço, variedades e também atores.
Até que em uma manobra, quebrei o nariz de Marcos, o mais bonito dos meus irmãos, que mesmo ficando um pouco diferente, não perdeu a soberania!
                   

Um comentário:

  1. Essa historia também lembro bem... escutei várias vezes e sempre vendo a felicidade em seu rosto ao falar do circo.

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